terça-feira, outubro 18, 2005

Viagem

(A janela oferece estímulos visuais que coloram os meus pensamentos...

Passo a viagem a olhar por ela e acendo assim as dissertações que me ocupam o tempo...)



Em andamento, tudo passa num instante...as imagens desaparecem à medida que a estrada se nos oferece, e as cores misturam-se numa sinestesia que nos avassala o temperamento...já tive mais paciência para acarretar aquilo que a velocidade me transmite...hoje talvez não seja um dia normal...talvez eu própria não seja 'normal' hoje...

Apetece-me abrir a janela, gritar bem alto! Tão alto a ponto de a terra estremecer... mas não tenho força para tal...invoco-vos a vocês!, para que gritem por mim...mas por favor, façam com que eu oiça o vosso grito...gostava de escutar-vos ao menos mais uma vez nesta viagem...

Lá fora os estímulos vão e vêm e as minhas pupilas embebedam-se de contrastes. Olho para trás...e arrependo-me...talvez Atlas também se tenha arrependido de olhar para trás...o peso nas minhas costas aumenta a cada dia, a velocidades vertiginosas...

E o mundo não espera por mim...as imagens correm e não as consigo alcançar...a metragem é cada vez mais longa...e o mundo não espera por mim, sei que não...



(Olho para aquela lua que me persegue, por mais rápido que avance...ainda vou descobrir porquê...)



Aos companheiros de viagem, aos que ajudam a percorrer esta estrada sem o saberem, e aos que abrem as janelas de cada dia...

domingo, outubro 16, 2005

Fecho os olhos...

Fecho os olhos e vejo um foco de luz...uma esperança que se acende lá no fundo...um horizonte que nasce porque eu existo...

Fecho os olhos e acordo...o sol aquece em mim as palavras que ficaram por dizer...os caminhos que percorro por ninguém...

Fecho os olhos e abraço o mundo...e canto e grito e disserto sobre uma existência que nasceu como uma força centrífuga que nos alcança...

Fecho os olhos e alimento a Alma...sou Eu sem precisar de o ser...

Fecho os olhos e perco-me...e nascem em mim as asas que os pássaros perderam...reflito...

Fecho os olhos e acendo os sonhos...onda que baila quando o mar está calmo...

Fecho os olhos e vejo...fecho os olhos e vejo...FECHO OS OLHOS E VEJO...

Foco de luz que me pertence...foco de luz que me ilumina...foco de luz de quem eu sou...

Fecho os olhos e sei...

terça-feira, outubro 11, 2005

Desvia a cortina...

- Olha lá para fora! Desvia a cortina e olha...

- Mas olhar para o quê!?

- Olha pura e simplesmente! Desvia a cortina e olha!



Hesitou... mas como o olhar dele era intimidador, com alguma desconfiança afastou a cortina e olhou lá para fora...



- Então, o que viste?

- O mesmo de sempre... o mesmo cenário, a mesma paisagem, as mesmas cores...ainda não percebi o porquê da tua insistência...

- Não te digo mais nada, o resto cabe-te a ti! Talvez um dia te arrependas de não ter visto um cenário diferente, uma paisagem diferente, cores diferentes... talvez um dia te arrependas...



Ele saiu e ela ficou pensativa... o que quereria ele dizer com aquilo!?

E por curiosidade, voltou a afastar as cortinas e olhou de novo lá para fora. Pela primeira vez, teve a sensação de que não conhecia a imagem que sempre vira pela janela do seu quarto... talvez nunca tenha tido tempo nem disposição para olhar realmente para os estímulos visuais que se lhe apresentavam...

Fechou a cortina, deitou-se na cama e pensou...

Pensou até que, por impulso, deu um pulo e se dirigiu de novo à janela. Afastou as cortinas, abriu o vidro e pela primeira vez nos tempos da sua existência sentiu a sinestesia que os seus poros tanto imploravam...

Agarrou nas chaves e saiu. Foi ter com ele. Sentiu-se bem e teve certeza do seu sorriso.

Tudo estava igual, nos mesmos sítios do costume. Mas para ela tudo parecia diferente...

...afinal tinha acordado para o mundo...







"Se estou sozinho, é num beco que me encontro
vou porta a porta perguntando a quem me viu
se ali morei, se eu era o mesmo, e em que ponto
o meu desejo fez as malas e partiu"

Sérgio Godinho, As certezas do meu mais brilhante amor

segunda-feira, outubro 10, 2005

A ti...

Perdi a conta às vezes que as tuas mãos me ampararam as quedas...

Perdi a conta às vezes que os teus sorrisos fizeram nascer nos meus lábios a vontade de sorrir...

Perdi a conta às vezes que os teus olhos cúmplices me falaram num silêncio absoluto...

Perdi a conta aos versos do Pessoa e do Ary e às melodias do Sérgio e do Zeca que me ofereceste como quem oferece as estrelas...

Perdi a conta aos sonhos que fizeste nascer em mim, às palavras sabedoras com que me empurraste para a frente...

Perdi a conta aos momentos junto a ti que ficaram eternizados em mim...

Perdi a conta às emoções que uso para te descrever...

Perdi a conta às confissões que guardamos a cadeado dentro de nós...

Perdi a conta às vezes que ficaste na sombra para que eu ficasse na luz...



Não digas nada porque hoje é a minha vez de dizer-te tudo aquilo que deve ser dito... e se algum dia a voz me falhar, que fiquem gravadas estas palavras na história de que fazemos parte...

(Que se cale o vento, que se calem os ecos, que se calem as vozes que não chegam a lado nenhum...)



Hoje é a ti que ofereço estas linhas... companheiro do passar das horas, do passar dos anos, do virar das páginas da nossa história...



E que passem muitos mais horas e muitos mais anos... e que estejamos juntos para virar muitas mais páginas de história...



"a noite passada fui passear no mar
a viola irmã cuidou de me arrastar
chegado ao mar alto abriu-se em dois o mundo
olhei para baixo, dormias lá no fundo
faltou-me o pé, senti que me afundava
por entre as algas teu cabelo boiava
a lua cheia escureceu nas águas
e então falámos
e então dissemos
aqui vivemos muitos anos"

Sérgio Godinho, A noite passada

domingo, outubro 09, 2005

Quimera de Cetim

Talvez o horizonte esteja demasiado distante...

Talvez o sol esteja alto demais...

Talvez as barreiras sejam excessivamente opressivas...

Talvez a força teime em falhar...

Talvez o mundo seja pequeno para nós...

Talvez a certeza nunca o tenha sido...

Talvez as palavras sejam fúteis...

Talvez as mãos tremam quando não devem...

Talvez as perguntas não tenham resposta...



Talvez... Talvez... Talvez...



Talvez a vida não fizesse sentido sem sonhos ou metas que esperamos atingir;



Talvez nos falte uma Quimera de Cetim...